quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Obsceno?

Texto alheio. De Gabriel Perissé

"A seguir cenas obscenas / Do próximo capítulo" - dizem os Engenheiros do Havaí numa canção.
Diante da novela brasileira e dessa mais ampla novela internacional com que a Idade Mídia diariamente nos brinda, tento aplicar conceitos teatrais para compreender um pouco a sua complexidade.
Toda história é agônica, no sentido de que há uma luta. Uma luta entre protagonista e antagonista. Agonistés, em grego, é o lutador. O protagonista é o primeiro (protós), o principal lutador, o herói. Antagonista é o que luta contra o herói.
No teatro greco-romano, protagonistas e antagonistas se debatiam, tendo os deuses como privilegiados amigos ou inimigos. Nessas lutas, nem tudo porém era representável. Havia um sentido claro do que era obsceno e não devia aparecer. Os dramaturgos sabiam que não era necessário expor ao público as cenas mais cruéis ou grotescas. Por isso, quando achavam conveniente, estas cenas eram encenadas ob scaenam, isto é, ficavam fora da cena, fora do palco, na parte de trás.
Quando a cena era obscena, os espectadores podiam apenas ouvir o que estava acontecendo, intuir a facada pelas costas, por exemplo. Era uma questão de bom gosto, mas sobretudo um efeito teatral: insinuar provoca a imaginação e a consciência muito mais do que a visão direta das coisas.
A cena mais cruel, e a que menos se via, era a morte do antagonista. Por mais vilão que fosse, por mais justa que fosse a sua morte, esta cena era um crime, e da visão nua desse crime o público era poupado. Ouviam-se os gemidos, mas não se via o sangue. E esta cena obscena se tornava inesquecível...
Estamos cada vez mais expostos a cenas obscenas. Essa conseqüência dos quase onipresentes meios de comunicação nos ajuda a ver mais, mas produz também uma estranha indiferença.
O efeito é paradoxal. Quanto mais podemos ver menos nos impressiona ver e rever o que se viu. Aquela expressão indignada "onde se já viu?!" perdeu sua força porque já vimos e estamos cansados de ver.
A excessiva exposição de cenas de guerra, ódio, hipocrisia e cinismo nos tornaram espectadores conformados. Não nos impressionam mais as cenas de fome. Não nos impressionam mais os grotescos discursos dos donos do poder. Nada mais nos impressiona.
Desligamos a tv ou o rádio, dobramos o jornal, desconectamos a Internet.
E vamos dormir.

Um comentário:

  1. Ótimo texto!Perfeito!
    E a gente vai achando tudo normal. Lembra de como o Sarney e sua gangue resistiu ferrenhamente para não deixar o poder(mamar na teta da vaca), e não deixou? Aquela resistência (leia-se cara-de-pau)toda causava espanto! Mas agora, não. Isso tá normalíssimo!! O Arruda ofereceu uma resistêncizinha de m..., presidente da câmara distrital tambem,a corja toda teve um feliz natal e um reveillon perfeito, tal...E já armaram todo um esquema la em Brasilia pra que a ideia (sem acento mesmo...aprendi com você) do impeachmant não prospere. E ninguém nem vai perceber quando o assunto sumir, e já praticamente sumiu da mídia, e os larápios estiverem ganhando novas eleições.
    Ai é "pácábá"!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

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